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Aquecimento global e invernos rigorosos: por que dias muito frios reforçam a certeza da emergência climática?

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Aquecimento global e invernos rigorosos: por que dias muito frios reforçam a certeza da emergência climática?
As baixas temperaturas no Sul, Sudeste e parte do Centro-Oeste no Brasil no ano passado tem estreita relação com as altas temperaturas no Canadá. Ambos eventos são consequências da emergência climática, ou, aquecimento global. São resultados extremos que ocorrem devido o aumento da temperatura no mundo e a mudança nas correntes marítimas e atmosféricas.
O ano de 2021 foi marcado por eventos extremos no Brasil e fora.
Em fevereiro, assistimos a uma cheia no Acre que impactou a vida de mais de 130 mil pessoas. Em julho, a seca persistente refletiu nos níveis dos reservatórios de grande parte das hidrelétricas do país. A crise hídrica e o aumento da conta de luz foram as consequências. Também aconteceu uma onda de frio extremo no Sul e no Sudeste. Além disso, no segundo semestre as inundações na Bahia e em outros países, como Alemanha e China, levaram a vida de centenas de pessoas.
O que esses eventos climáticos têm em comum? Eles estão diretamente relacionados ao aumento da temperatura média global.
Pode parecer estranho e, até mesmo, equivocado, relacionar o clima mais quente com invernos mais rigorosos. Mas é o que os estudos científicos como esse indicam. No documento, uma equipe de cientistas investigou a relação do aumento do degelo no Ártico com os dias mais frios. Contudo, concluíram que há mínima influência entre os dois acontecimentos e constataram a principal causa desses episódios extremos: a mudança na atmosfera do planeta seguida da elevação de temperatura.
Ao longo desse artigo, iremos apresentar brevemente a relação entre a emissão de poluentes e o aquecimento global. Depois, iremos expor situações em que figuras públicas cometeram equívocos conceituais e propagaram fake news climáticas. Para então, finalmente, explicar a confusão criada a respeito dos eventos extremos no clima.
1- A Emergência climática e a poluição do ar
Primeiramente, nosso interesse em discutir as mudanças climáticas surge da relação direta que esse fenômeno tem com a poluição atmosférica. Nesse artigo (linkar artigo “Poluição Atmosférica: 4 motivos urgentes para discutirmos”) da iniciativa Médicos Pelo Ar Limpo, apresenta-se a conexão entre ambos. Ela se dá, basicamente, devido a determinados contaminantes que promovem as alterações do clima.
Os poluentes climáticos são conhecidos como poluentes climáticos de vida curta (PCVC). São chamados assim, pois têm vida curta na atmosfera (de alguns dias a algumas décadas), apresentam efeitos nocivos à saúde, ao ambiente e também agravam o efeito estufa. Os principais PCVC são o carbono negro, o metano, o ozônio troposférico e os hidrofluorocarbonetos (HFC).
Segundo o Ministério do Meio Ambiente, as fontes de emissão desses gases são antropogênicas, ou seja, resultam da atividade humana na Terra. A de carbono negro se dá pela queima ao ar livre de biomassa, motores a diesel e a queima residencial de combustíveis sólidos (carvão, madeira). As fontes de metano são sistemas de óleo e gás, agricultura, criação de animais, aterros sanitários e tratamentos de esgotos. Com relação aos HFCs, seu uso ocorre principalmente em sistemas de ar condicionado, refrigeração, supressores de queima, solventes e aerossóis.
Um exemplo de contaminação atmosférica que agrava o aquecimento global é a ação do material particulado em regiões polares. Esse poluente viaja longas distâncias e gruda sobre o gelo. Quando isso acontece, a calota polar altera sua cor, ficando mais escura. Essa alteração na tonalidade faz com que ocorra maior absorção de luz solar, o que promove o aumento da temperatura.
“Ao lidar com a poluição do ar, também lidamos com uma solução crítica, e fácil de implementar, para as mudanças climáticas. Poluentes de vida curta são negativos em todos os sentidos, e temos tecnologias e políticas comprovadas para reduzir a poluição do ar economicamente e imediatamente”, afirma o especialista em mudanças climáticas da ONU Meio Ambiente, Niklas Hagelberg.
2- A difusão do negacionismo científico e seu impacto na consciência ambiental da população
Agora que a relação entre poluição do ar e a emergência climática foi apresentada, é preciso discutir sobre as consequências do negacionismo científico no discernimento da população a respeito do aquecimento global.
Infelizmente, muitas figuras públicas fomentam o obscurantismo e desconsideram as pesquisas mais recentes e prestigiadas de cientistas do clima. Recentemente, o filme “Não Olhe Para Cima”, estrelado por Leonardo DiCaprio, ilustrou brilhantemente a situação que vivemos atualmente. Nessa obra, quando pesquisadores descobrem que um meteoro irá colapsar com o planeta Terra em 6 meses, a postura dos governantes é de completa negação e descaso. A angústia gerada pela ficção é compatível com a realidade, quando comentários como esses são proferidos aos montes por governantes e outras figuras públicas:


Tweet de Donald J. Trump: "No belo Centro-Oeste, as temperaturas estão chegando a 60 graus negativos, os dias mais frios já registrados. Nos próximos dias, espera-se que faça ainda mais frio. As pessoas não conseguem durar minutos lá fora. O que está acontecendo com o Aquecimento Global? Por favor, volte depressa, precisamos de você!
Esse tipo de comentário, vindo de figuras públicas tomadoras de decisão e com notória visibilidade, é preocupante, pois pode confundir ainda mais a população sobre um assunto complexo como as mudanças climáticas. Além disso, essas falas demonstram a falta de conhecimento sobre o trabalho de centenas de cientistas, uma vez que eventos extremos, como o frio relatado, são consequências do aquecimento global.
O colapso do clima é real e as evidências estão em todos os lugares, tanto em artigos científicos, como na vida de milhares de pessoas. Por exemplo, esse documentário exibe um pouco a situação de indivíduos que foram impactados diretamente pelas mudanças climáticas. Assim, como bem pontua o filme “Não Olhe Pra Cima”: “Se não conseguimos concordar e acreditar em fatos, observados, estudados e concluídos pelos cientistas, então nós estamos ferrados”.
3- Entendendo a confusão de conceitos climáticos
Felizmente, a confusão criada pelos negacionistas climáticos pode ser facilmente resolvida a partir da explicação de alguns conceitos. Nessa seção você vai entender a diferença entre Clima X Tempo, a questão dos Recordes de Temperaturas Máximas, os chamados eventos extremos e, finalmente, a verdadeira causa dos dias mais frios.
Clima x Tempo
Antes de mais nada, é preciso compreender as diferenças entre o significado de “Clima” e o significado de “Tempo”. O primeiro refere-se a tendência de temperaturas no longo prazo, ou seja, é um conceito mais abrangente. No caso, a Climatologia é a área responsável por estudar o comportamento do clima em extensos períodos.
Por outro lado, o “Tempo” ou a “Previsão do tempo”, diz respeito a condições atmosféricas pontuais, locais e percebidas em um curto espaço de tempo. Por exemplo, a onda de frio que aconteceu nos EUA, mencionada por Donald Trump no tweet acima. Ou seja, mesmo que em um ponto específico do planeta esteja fazendo mais frio, o mundo como um todo está, na média, mais quente. Inclusive, segundo a Organização Meteorológica Mundial (OMM), agência da ONU especializada em meteorologia, o ano passado foi um dos sete anos mais quentes da história.
Recordes de Temperaturas Máximas
Como foi mencionado acima, estamos assistindo a recordes consecutivos de Temperaturas Médias Globais. Martin Beniston, ex-diretor do Instituto de Ciências Ambientais da Universidade de Genebra, na Suíça, e um dos maiores especialistas sobre clima no mundo, afirma que os dias com recorde de temperatura máxima são muito mais frequentes do que dias com recorde de temperatura mínima. Isso está acontecendo desde os anos 80.
"Diversos estudos apontam que o mundo ficou 1 grau Celsius mais quente no último século. Em alguns países do mundo, como na Suíça, essa variação chegou a 3 graus Celsius", pontua Beniston.
Eventos Extremos
O aquecimento global, causado pela ação humana, tem diversos desdobramentos na vida na Terra. Entre elas, a maior ocorrência de eventos extremos. Entre esses fenômenos cabe mencionar:
  1. A onda de frio extremo, em julho de 2021, no Sul e no Sudeste do Brasil
  2. O calor de 49,6ºC na cidade de Lytton, no Canadá
  3. Chuvas e inundações na China, Alemanha e Bahia
Como acontecem esses eventos?
O calor e a chuva, por sua vez, são ocasionados diretamente pelo aumento de Gases de Efeito Estufa na atmosfera terrestre. Esses gases dificultam a dispersão e saída do calor, gerando o famoso efeito estufa. A energia térmica contida na Terra eleva as temperaturas e provoca maior evaporação da água dos oceanos. Assim, temos cenários de calor extremo, como no Canadá, e chuvas brutais, como na China, Alemanha e Bahia.
Finalmente, o inverno rigoroso e o aquecimento global
No último relatório do IPCC, de 2021, afirma-se que as temperaturas extremas estão diretamente associadas com a ação humana. No caso dos invernos rigorosos, ocorre que um dia mais quente no Ártico, pode resultar em dias mais gelados em regiões contíguas, como Europa e América do Norte. Assim, com as temperaturas subindo em todo globo, aquele frio contido em regiões polares acaba se dispersando para outras áreas. Isso acarreta em ondas de frio extremas e fora do comum.
Essa pesquisa, desenvolvida por cientistas da Universidade de Exeter, na Inglaterra, da Universidade de Groningen, na Holanda, do Centro Canadense para Análise Climática, no Canadá, do Instituto Meteorológico Real da Holanda e do Instituto de Pesquisa de Energia e Sustentabilidade em Groningen, também da Holanda - concluiu que mesmo as ondas de frio estão no contexto da crise ambiental do aquecimento global.
Eles estudaram a questão do degelo em regiões polares e descobriram que, há mínima influência desse fenômeno sozinho com os dias mais frios. Isso porque, o derretimento das calotas não é a causa e sim uma das consequências do colapso climático. Este último, sim, verdadeiro causador dos eventos extremos. Ou seja, é a mudança na atmosfera - mais precisamente os GEE emitidos por ações humanas - que leva o ar quente para regiões remotas e geladas, trazendo o ar frio para as latitudes médias.
Ademais, a partir do aumento do degelo, a superfície do mar também aumenta. Isso propicia uma liberação maior de energia térmica, enfraquece a circulação de ar frio sobre regiões polares e favorece a sua liberação para outras áreas. Esse deslocamento de ar gelado polar é conhecido como vórtice polar.
“As condições meteorológicas extremas estão relacionadas às mudanças climáticas da mesma forma que fumar pode causar câncer”, afirma Friederike Otto, um dos autores do relatório IPCC e pesquisador de mudanças climáticas na Universidade de Oxford.
4- O que você pode fazer?
Agora que você já sabe que o aquecimento global é um problema real e com diversas consequências, você pode enviar este artigo para outras pessoas que ainda não têm essa consciência. Outra coisa simples que você pode fazer é acompanhar e apoiar nosso trabalho, através das redes sociais.
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Enfim, é sempre bom lembrar: as previsões não são boas, mas ainda podemos mudar esse jogo. Antonio Gramsci, grande filósofo italiano, nos lembra que é possível ser pessimista na razão e otimista na vontade. Esse otimismo pode ser encontrado na ação conjunta, que é a única coisa que poderá resolver o colapso climático. E então, vamos nos unir?